LIFE

Eu sei. Eu sei que está tudo errado comigo. Eu sei que nunca agradei a ninguém, nem tão-pouco é esse o meu objectivo. Nunca fui fofa, nem querida, nem engraçada. Tentava um sorriso, mas quando não conseguia não havia a ponta de um problema. Estava-me bem nas tintas. O que os outros pensavam, não me fazia a mínima confusão. Continua a não me fazer confusão, aliás. Mas agora que me resta tão pouco ou nada, gostava de ser diferente. Gostava de ver outro tipo de olhares para mim. Gostava de não ver os olhares superiores das pessoas que se acham grandes, mas no fundo não passam do chão. Gostava de não ouvir bocas de quem se acha esperto, mas no fundo, espertos são os cães. Gostava que me respeitassem como pessoa e como mulher. Gostava que me levassem a sério. Essas pessoas que andam por aí de nariz levantado não sabem o que é não conseguir dormir por causa de um problema que nos atormenta. Por causa de um problema que se não nos tirar a vida de uma maneira, tira-nos de outra. Não sabem o que é andar na rua e não ver o chão à nossa frente. Não sabem o que é estar a descer as escadas do vosso apartamento e não ver os degraus debaixo dos pés. Não sabem o que é ir a um centro comercial, estar num elevador com mais pessoas, e no sítio onde nós estamos estar um buraco no chão. Não sabem o que é ver pessoas que não existem. Não sabem o que custa… hum… não sabem mesmo o que custa sempre ter tido uma vida normal e agora, do nada, estar tudo diferente. Não sabem o que é acordar com dores de cabeça infernais e adormecer com elas, sem um minuto de descanso. Não sabem qual a sensação de a vossa língua tropeçar em sítio nenhum e vocês não conseguirem falar. Não sabem o que isso é. E nunca irão saber, porque o vosso ar sabichão vos vai impedir de saber o que é realmente a vida.

Não sabem o que é, pois não? Hum, tal como eu pensava.

- Margarida Louro